Ser Escritor part. 1

Tobias havia saído de sua cidade no interior das Minas Gerais, com apenas o seu sonho de criança na cabeça: SER UM ESCRITOR. Ele não queria ser famoso ou rico, pelo contrário, apenas queria que quando alguém mencionasse teu nome lembre-se de quem se fala.

Depois de juntar dinheiro por sete meses, pegou o ônibus bem no dia em que completava anos de vida. Vinte e um anos. Chegou sete horas depois de ter partido na casa de seu tio Américos sem nem ao menos avisá-lo de sua visita.

Entrou, e foi recebido logo a beijos e abraços e já lhe disse o propósito de viajar muitos quilômetros até São Paulo.

O tio acenou com uma cara de decepção e disse:

- Não sejas tolo moleque. Fique por alguns dias aqui, arrume um emprego e faça sua vida.

- Mas tio! Quero ser um escritor e contava com sua ajuda.

- Apenas durma aqui e amanhã irás trabalhar e arrumar uma moradia. Tome cuidado! Não digo que mão se divirta, prosseguiu o Américos; consinto que vá ao teatro de vez em quando; se der bem com alguma família, pode freqüentá-la; mas tudo isso, já se vê, com muita prudência e com juízo. Evite as más companhias, fujas dos vadios e dos viciosos; não freqüente a Avenida São João; não entre nas casas de dança! E, abaixando a voz chegando-se mais para o moço, disse, com o mistério de quem faz uma revelação terrível:  E, principalmente, meu sobrinho, não se meta a ser escritor.

Tobias ergueu a cabeça, surpreso:

- Como?

- Sim, confirmou o outro. – Não se meta a escritor, que isso tem posto muita gente a perder! Poderia citar-lhe mais de cem nomes de escritores fracassados, de quem fui correspondente, que perderam anos, que cortaram a carreira por causa da maldita patifaria das letras! Eu os vi, a todos, por aí, enchendo as ruas de pernas, mal alimentados, e mal vestidos, com a mesada suspensa pela família, a fazerem garbo das suas necessidades e ás vezes até das suas bebedeiras!

Tobias ouvia agora o tio com singular atenção.

- Fuja! Continuava aquele: fuja de semelhantes porcarias! Se não quiser ver o seu nome todos os dias na boca do mundo!

- O nome?

- Sim, sim, o nome, que seu pai lhe pôs á pia do batismo! Se não quiser vê-lo de boca em boca não se meta a escritor! E ainda se fosse apenas isso... Vá! É feio, mas enfim, sempre há homens sérios, cujo o público não ignora; o pior é que ás vezes rebenta por aí cada descompostura, que é mesmo uma vergonha! Quem se deixar cair em tal desgraça não está livre das chuvas da imprensa e dos comentários do mundo inteiro!

E o Américos, para melhor afirmar os seus argumentos, principiou a citar nomes.

- Mas esses nomes – acudiu Tobias recorrendo ás leituras – esses nomes são todos muitos distintos. O senhor está citando os nossos poetas mais conhecidos!

- Ah! Ninguém nega que não sejam conhecidos, nem que não sejam poetas, mas posso afiançar-lhe que não são homens sérios e ricos.

- Homens sérios? Que diabo entende o senhor por homem sério?

- Ora essa! Que entendo por homem sério? – é boa! Por homem sério entendo todo aquele que não dá escândalos, que não é tratante e que se ocupa em alguma coisa séria! Enfim, todo aquele que trabalha!

- Então quem escreve não trabalha?

- Não digo isso, mas...

- Acabe.

- Mas não é  um trabalho sério!

Tobias, em vez de prosseguir no diálogo, olhou para Américos com um gesto que tanto podia ser de lástima como ser repugnância, e, deixando escapar o seu predileto sorriso de ironia, ergueu-se, batendo-lhe levemente no ombro e disse:

- O senhor é um grande homem... Mas nunca deixe ninguém dizer que você não pode fazer algo. 

Continua...